sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

A bailarina de Degas


As bailarinas terminavam de se alongar após o ensaio enquanto um homem, já acima da meia idade, esperava numa das cadeiras da primeira fileira. Quando chegou não faltava muito para o ensaio terminar, talvez uns quarenta minutos, tempo o suficiente, porém, para que não aguentasse o cansaço e dormisse ali mesmo, naquela cadeira da primeira fila. Nenhuma das bailarinas se importou verdadeiramente com aquilo, apesar de algumas trocarem comentários de censura só por hábito, exceto àquela que era esperada. Ela que resolveu aproveitar o sono dele para, além de trocar de roupa, dar um retoque na maquiagem, um pouco desgastada pelos movimentos do balé, antes que saíssem para o jantar, não hesitou, portanto, em despedir-se das companheiras rapidamente e correr de volta para o camarim.

A idade começava alcançá-la. Ainda que, só agora ela começasse a perceber como as covinhas que tinha no canto da boca eram substituídas lentamente por rugas. Era ainda, sem dúvida, uma mulher muito agradável de se ver, ainda que não fosse o que se chama comumente bonita: seus lábios grossos, sua pele não suave, pelo contrário, como se cada expressão que fizesse deixasse uma camada a mais em sua pele, seus olhos sempre-os-olhos esbugalhados que denunciavam um cansaço que nunca estava de acordo com o sua habitual disposição. Um rosto que nenhum homem que passou pela sua vida iria se esquecer (apesar que de seu corpo nenhum lembrava mais).

Ela nunca se esquecia do que seu marido lhe dizia quando tomava um pouco de uísque, quando se punha a falar de todas as mulheres que tivera na vida (ela sabia que até nesse mesmo instante ele não havia aceitadoa ainda a monogamia), que jamais quisera, apesar de que oportunidades não me faltaram!, se meter com aquelas metidas a modelo. Não que ele fosse daqueles que gostava de mulheres feias, por serem feias, não, isso não. Ele apenas preferia que as suas mulheres tivessem certas falhas, não muitas: uma pinta mal colocada, um nariz mais achatado, dentes desalinhados, coisas assim, pequenas, mas que davam para ele  uma sensação maior de equilíbrio. Balela, ela não esquecia mas também não acreditava. Sabia que a razão em preferir as “falhadas”  era que achava que isso melhorava a foda.

(...)

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